quinta, 23.07.2020

Como pensa o doador brasileiro (e o que você, empreendedor, tem a ver com isso)

MOL na mídia


A pesquisa Brasil Giving 2020 mostra que a confiança nas organizações sociais está aumentando - e que as empresas que abraçam a filantropia têm um papel fundamental nessa percepção positiva
A pesquisa Brasil Giving 2020 mostra que a confiança nas organizações sociais está aumentando - e que as empresas que abraçam a filantropia têm um papel fundamental nessa percepção positiva

Já falamos aqui sobre a divulgação da pesquisa Giving USA 2020, que revelou as principais tendências de comportamento de doadores norte-americanos em 2019. O relatório trouxe consigo ensinamentos preciosos de uma nação que já tem mais experiência e desenvoltura com ações filantrópicas em comparação ao Brasil.

Agora é hora de falarmos de nós. Isso porque, em julho, o Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS) publicou o Brasil Giving 2020 - Um Retrato da Doação no Brasil. O relatório foi feito em parceria com a Charities Aid Foundation (CAF) e está disponível para consulta e download.

Vale ressaltar: a pesquisa que originou a análise foi feita entre agosto de 2018 e julho de 2019, antes de qualquer sinal de que estaríamos vivendo uma pandemia global e antes de qualquer doação emergencial ganhar destaque no Brasil. Ou seja: as informações não levam em consideração números marcantes como os mais de R$ 6 bilhões doados desde março de 2020 para o combate à COVID-19.

E o impressionante é que, mesmo assim, os dados não são tímidos ou desanimadores. Pelo contrário: há diversas razões para ser otimista com as informações apresentadas (o que, de certa forma, já era um prenúncio para o momento histórico da filantropia que vivemos nessa pandemia).

Com as respostas trazidas pelo relatório há, também, um senso de dever que deve ser abraçado pelos empresários daqui para frente: uma lida rápida no Brasil Giving 2020 deixa claro que, se quiserem agradar seus consumidores, sobreviver e prosperar, os negócios deverão tornar o impacto social uma prioridade absoluta daqui para frente. O outro caminho será, sem dúvida, a obsolescência e o esquecimento.

Uma das razões para comemorar é a elevação da confiança dos brasileiros nas ONGs: em 2015, a Pesquisa Doação Brasil havia apontado a desconfiança como o grande impedimento para um potencial doador colocar a mão no bolso. Agora, a percepção geral parece estar mudando para melhor: a pesquisa mostra que 74% dos entrevistados acreditam que a maioria das organizações sociais trabalha arduamente para alcançar resultados positivos para seus beneficiários, o que leva a entender que a desconfiança perdeu força. A trilha para a insuspeição, porém, ainda é longa e especialmente trabalhosa para as ONGs brasileiras: 53% das pessoas confiam em organizações sociais de origem internacional, mas só 43% têm o mesmo sentimento em relação a instituições nacionais.

Ainda assim, mais da metade dos entrevistados (55%) relataram que preferem doar a causas locais. Ou seja: se investirem em visibilidade e transparência, organizações menores e com mais capilaridade nas vizinhanças brasileiras têm um forte poder de persuasão entre quem pretende se tornar um doador - o que é uma grande oportunidade nos tempos atuais. 

E é aqui que o papel das empresas começa a aparecer no Brasil Giving 2020: a desconfiança do brasileiro em relação a organizações sociais e sem fins lucrativos diminui quando elas contam com apoio corporativo. Metade dos entrevistados concorda que as instituições que possuem esse tipo de suporte são mais confiáveis do que as que não possuem.

Além disso, 86% concordam que as empresas brasileiras devem apoiar as comunidades locais, e 71% dos entrevistados afirmam estar mais inclinados a comprar um produto ou serviço de uma empresa que doa a causas sociais ou que apoia sua comunidade local. O número é ainda maior entre mulheres: 77% contra 65% dos homens. A informação se assemelha ao dado do relatório Giving USA 2020, que apontou que 79% dos norte-americanos seriam mais leais a marcas engajadas em questões sociais. 

Há uma tendência sendo apontada aqui: os consumidores estão vendo suas compras como um ato cada vez mais grandioso do que uma simples transação. E, por isso, estão procurando negócios que demonstram preocupação com outras grandezas além do número de vendas e porcentagem de lucro. Comprar, cada vez mais, é um ato de engajamento social.

Informações como essa mostram que a doação não consiste apenas em debitar um valor da própria conta corrente para que ele seja creditado em outra. O ato de doar está se tornando um gesto maior do que uma simples ação que se basta nela mesma. O indivíduo está cada vez mais curioso para saber como sua ajuda o torna um agente de transformação positiva na sociedade. Doação e cidadania caminham cada vez mais juntas.

Para o doador, é cada vez mais importante que seu apoio tenha um significado evidente, que nutra seu prazer em ajudar e encoraje uma ação recorrente. O próprio relatório aponta: 52% dos entrevistados alegam que ajudam porque se sentem bem com isso; 44% o fazem porque se preocupam com a causa que apoiam; e 42% doam porque creem que o gesto pode fazer a diferença. Unindo esses três porquês, empresas são plenamente capazes de criar produtos, apoiar organizações e buscar investimentos que gerem impacto social que satisfaça e fidelize seus clientes. 

Ao lado de ONGs que estejam alinhadas às causas que seus funcionários e consumidores estão mais propensos a abraçar, por exemplo, é possível (e absolutamente necessário) gerar impacto com transparência, dar números claros e humanizar as doações com histórias de quem é beneficiado pelo apoio recebido. É possível, assim, transportar o doador para a outra ponta da transação, conferindo a ele o protagonismo que merece quando faz uma boa ação.

O brasileiro está doando cada vez mais (R$ 617 em 12 meses de acordo com a pesquisa - um aumento significativo em relação ao ano anterior, quando esse valor era de R$ 532). O argumento de que as pessoas são egoístas faz cada vez menos sentido. Aos poucos, desenha-se no Brasil um cenário mais fértil para a generosidade. Às empresas, cabe subir nesse mesmo bonde, a fim de compreender esse comportamento e usá-lo em favor próprio. 

Hoje, isso é seguir uma tendência e integrar uma teia filantrópica cada vez mais extensa, conectada, criativa e disruptiva. Amanhã, isso pode significar a sobrevivência do seu CNPJ.

Roberta Faria e Rodrigo Pipponzi são empreendedores sociais e fundadores da MOL, a maior editora de impacto social do mundo. Vendendo produtos socioeditoriais (como livros, revistas e calendários) em grandes redes varejistas, a empresa já doou mais de R$ 35 milhões para 71 ONGs de todo o Brasil.

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O texto acima foi originalmente publicado no site da revista Época Negócios.




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